Book Review: “Mulheres de minha alma” de Isabel Allende

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“A muchas hijas nos ha tocado vivir la vida que nuestras madres no pudieron vivir”

O quanto a idade realmente pode nos mudar? Ao ler a obra tive contato com uma Isabel que parecia nunca ter perdido a sua essência. Uma mulher que se viu feminista desde os primórdios de sua infância nos anos 1940 e que segue engajada no movimento até hoje.

Uma mulher que desde cedo se vê presa nas amarras do machismo e que luta constantemente por um mundo melhor não só para si, mas para as próximas gerações de mulheres. Isabel se engajou na luta no auge do feminismo em 1960 e nunca parou. Basicamente, Isabel viveu (e ainda vive) muita coisa.

Ela é uma pessoa (aparentemente) com a vida perfeita, mas Isabel já teve muitas perdas e já tomou decisões precipitadas. Em seu relato, a escritora reconhece suas falhas, mas mostra que elas não definem quem Isabel realmente é e que, além disso, sempre existem novos caminhos para se fazer o que acredita. Essa mulher é uma inspiração e a sua história me arrancou suspiros e lágrimas.

Mesmo nascida 54 anos antes de mim, é impossível não se identificar com cada parte de sua história. Acredito que pode ser triste ainda passar pelo mesmo machismo estrutural que viveu há mais de 70 anos, mas é enriquecedor ver tantos pontos que nos une. Ser mulher é incrível, mas ser mulher latino-americana é ainda mais bonito.

Eu diria que o livro de 180 páginas é um poço de luta e inspiração para todas as pessoas. É um livro de enorme sensibilidade e que faz o leitor se sentir em uma conversa íntima com Isabel. Me senti próxima e amei saber mais sobre a sua relação com os personagens que criou e com os espíritos que ela ainda conversa.

Recomendo esse exercício de inspiração para todos, mas indico que leia “Filha da Fortuna” antes (já escrevi sobre essa obra). É uma experiência única para os “leitores fiéis” de Isabel Allende, assim como ela mesma nos chama.

Book Review: “Middlemarch” de George Eliot

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“People are almost always better than their neighbors think they are.”

“Middlemarch, A Study of Provincial Life” é uma obra da autora britânica Mary Anne Evans, que escreveu como George Eliot. O livro apareceu pela primeira vez, no formato de oito volumes, de 1871 a 1872. A obra é situada em Middlemarch, uma cidade fictícia inglesa de Midland, de 1829 a 1832, e retrata a realidade dos moradores daquele local (casamentos, projetos, mudanças sociais e políticas, etc.).

Agora viajar e conhecer a cidade de Middlemarch:

Meu primeiro conselho para essa viagem é se preparar para imprevistos. Middlemarch é um local em que não se deve criar expectativas, pois seu planos possivelmente darão errado. Assim como o nosso ilustre narrador disse “we mortals, men and women, devour many a disappointment between breakfast and dinner-time”. Essa sensação de “dar tudo errado” permite com que os personagens se desenvolvam brilhantemente e desafia o leitor. Isso não é fácil, mas estamos em boas mãos com Eliot, que faz esse desafio ser uma experiência enriquecedora.

Parte desse mérito se dá pelo fato dos personagens serem humanos: ninguém é 100% bom e nem 100% mau. As heroínas e os heróis falham em algum momento, ainda que depois tudo ocorra bem (ou não rs). Penso que a sensação de decepção ocorre por conta da grande ambição de alguns moradores de Middlemarch. É aquilo: melhor criar unicórnios do que expectativas, não é mesmo? rs

Queria escrever sobre alguns personagens centrais, como Dorothea Brooke, Tertius Lydgate, Caleb Garth e Nicholas Bulstrode. Mas acho que é mais interessante falar da obra como uma mentalidade coletiva, pois a cidade não se restringe apenas aos personagens e, muitas vezes, impactam diretamente os objetivos deles.

O clima de Middlemarch é de mudança e pressão social. A origem das famílias conta muito para a reputação na sociedade. Então, se a sua origem não é conhecida, não recomendo a viagem para lá.

Além disso, Middlemarch se passa durante um período tumultuado na história inglesa, quando mudanças políticas, científicas e a própria industrialização causaram um grande impacto no país. Os moradores de Middlemarch se opõem inflexivelmente à reforma política e científica, tanto pelo medo da mudança quanto pelo apego a modos de vida antigos e disfuncionais. Essa oposição intensifica a impressão de que eles são uma comunidade retrógrada, desconfiada de mudança e progresso – mesmo que isso possa beneficiá-los.

Senti que Middlemarch foi uma ancorada. Um livro que coloca os nossos pés no chão e faz a gente sentir que nem sempre a vida é linda e que nem sempre tudo é aquilo que sonhamos. Foi um livro divertido e, ao mesmo tempo, melancólico.

Se quiser ver a minha análise sobre Direito e Middlemarch (Livro V), assista o vídeo:

Book Review: “Klara e o Sol” de Kazuo Ishiguro

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“People saying how you’ve become too clever. There’re afraid because they can’t follow what’s going on inside any more. They can see what you do. They accept that your decisions, your recommendations, are sound and dependable, almost always correct. But they don’t like not knowing how you arrive at them. That’s where it comes from, this backlash, this prejudice.”
Klara and the Sun (Kazuo Ishiguro – p. 328).

A observação com uma atenção direcionada faz parte da maneira em que aprendemos as coisas no dia-a-dia. E, na medida em que imprimimos os nossos valores em nossas criações, os robôs humanoides também teriam essa capacidade. Isso é o que acontece com Klara, grande protagonista da obra “Klara e o Sol” de Ishiguro.

Essa obra, para mim, representa o quanto colocamos o melhor de nós em nossas criações. Klara é uma robô criada para diminuir a solidão de crianças abastadas em um futuro distópico. Há uma clara separação social e biológica entre as pessoas, mas isso deixarei em “aberto” para vocês ir descobrindo no decorrer da leitura (mas fica a dica!).

A Klara é a combinação do que há de melhor no ser humano. Ela tem um amor, carinho e atenção que só os mais nobres poderiam demonstrar. E, por isso, ela é também diferente dos outros robôs. Ela pensa que observa muito bem os humanos, mas eu discordo. Acredito que ela observa os humanos dentro de um ideal e, com base nele, interpreta o que acontece. Caso ela puramente observasse os humanos e aprendessem com eles, talvez ela se tornasse um robô da Microsoft ou um pouco mais como os outros robôs de sua loja.

Mas ver o mundo pelos olhos da Klara é uma experiência muito boa, porque permite com que a gente faça uma autorreflexão. O livro é de altíssima sensibilidade e tem altos e baixos nos acontecimentos na vida de seus personagens. Ishiguro consegue mudar o clímax do livro de “meigo” (por assim dizer rs) para assustador de maneira brilhante. A escrita é linda e muito bem trabalhada.

Não tenho o costume de ler livros sobre robôs ou futuros distópicos, mas esse foi muito bom e me fez querer conhecer muitos outros. Recomendo esse livros para todes!

Amizade Literária: “O conde de Monte Cristo” de Alexandre Dumas

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Uma amizade que começa em meio ao desespero e na solidão. Quando os olhos se acostumam com o escuro e até mesmo a sua própria voz assusta… Foi nesse contexto que surge o meu personagem predileto da obra “O Conde de Monte Cristo”.

O abade Faria foi um personagem que instigou a minha criatividade e que ainda me faz sentir emocionada ao lembrar de sua trajetória no livro. Toda vez que ele aparecia (ou era mencionado), as lágrimas de emoção e admiração surgiam nos meus olhos… precisei ler 2x (pelo menos) toda vez que ele apareceu no livro.

Ele é uma figura que levarei comigo para a vida. Ele é um gênio e sinto como se fosse alguém que eu tivesse conhecido no trabalho ou na roda de amigos. Sinto um carinho muito grande por ele e me encanta saber que ele foi baseado em uma pessoa real: o nome do moço era Abade Torri.

Me peguei imaginando várias possibilidades para ele dentro do universo do livro, então a sensação de “e se…?” foi a minha companheira nessa leitura. Acho inevitável não imagina-lo em diversas situações… até porque ele foi decisivo no livro. 

Assim como no livro, para mim, ele é a luz que aparece no escuro da solidão e da tristeza. “Luz” tanto no sentido iluminista, pois é a razão que nos coloca no chão, quanto de conforto em um ambiente escuro e hostil.

Queria muito me estender e falar sobre cada ponto que admiro nele… mas vou apenas recomendar que leiam a obra-prima que é “O conde de Monte Cristo” e espero que se encantem com o personagem assim como eu ❤️

Book Review: “Little Women” de Louisa May Alcott

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“Little Women” de Louisa May Alcott é uma dessas obras quase impossíveis de resenhar, na minha opinião. É um livro complexo (sim, bem mais do que parece) e que me fez sentir como se tivesse deixado um pedaço de mim com o livro, e um pedaço dele em mim.

Eu fico pensando nos personagens mesmo depois de ter terminado a obra, pois ela é tão envolvente que faz a gente se sentir como se fôssemos amigos deles. Nesse livro dá para sorrir, chorar e se surpreender bastante.

“Mas Anna, o que tem de tão profundo e complexo em um livro infanto-juvenil?” Vamos lá: acho muito superficial achar que livros destinados ao público jovem não podem ser complexos. Não olhar profundamente Little Women é perder a melhor parte da obra: ver que, apesar das adversidades, as meninas são criadas para serem donas de seu próprio destino – algo que as confunde, pois a sociedade impõe justamente o contrário.

São mulheres de vida simples e que amadurecem durante o livro. Então conseguimos ver elas aprendendo coisas que já aprendemos no decorrer da nossa vida (daí que vem o que ouvi bastante aqui: “é um livro moralista”). Não achei moralista, porque nós aprendemos as mesmas coisas que as personagens aprenderam (se ferrando ou acertando), tanto na relação entre irmãs/amigas quanto nos objetivos de vida em geral. Então é natural que elas levem esporros na obra e ainda se critiquem por terem pensado/agido de certa maneira.

Outro ponto interessante é que as quatro irmãs são totalmente diferentes entre si e seguem rumos igualmente distintos. A genialidade de Louisa é capturar vários tipos de personalidades e criar destinos próprios para cada um dos personagens.

O livro é repleto de reviravoltas e eu acho que vale muito a pena ler! A leitura flui super bem e nos acolhe. Jo March é minha heroína.

Book Review: “A honra perdida de Katharina Blum” de Heinrich Böll

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“A honra perdida de Katharina Blum” ou “De como surge a violência e para onde ela pode levar” de Heinrich Böll é um livro bastante rápido e intenso. Escrito da maneira bem jurídica.

O livro é resultado do teste que Böll faz para ver o limite que o sensacionalismo das mídias pode causar na vida das pessoas comuns por meio de difamações e violências psicológicas. Além de ser também uma crítica que o escritor fez ao jornal alemão Bild, conhecido por ser super sensacionalista.

Nesse teste, vemos uma jovem chamada Katharina Blum, que trabalha como empregada doméstica e possui um ar empreendedor. Ela combina 100% com o seu nome: Katharina, tem origem no grego katharós, que quer dizer “casta, pura”, e Blum é muito parecido com Blume (flor, em alemão). Logo, ela é uma moça super casta mesmo, e conhecida como “freira” pelos seus amigos.

Katharina sempre teve uma vida parada e de pouca emoção (já que trabalhou desde os 12 anos como doméstica e sofreu abusos). Mas, em um belo dia, ela conhece um rapaz em uma festa de Carnaval, se apaixona e o leva para sua casa.

Só que, mal sabia ela (ou sabia? rs), que ele era vigiado pela polícia e suspeito de cometer assassinatos e furtos à bancos. Ele seria o conhecido “terrorista” dos anos 70 na Alemanha (crítica latente de Böll). E Katharina é considerada pela polícia como suspeita de ajudá-lo a escapar dos olhos da polícia após a noite em sua casa.

Todos nessa obra são suspeitos da polícia, mas não do jornal. O jornal já incrimina Katharina de diversos crimes e ataca a sua moral de maneira intensa, com uma manchete nova todos os dias. Ela, que sempre foi conservadora e reservada, se vê vítima de diversas mentiras e manipulações do jornal (sem nome) que queria ganhar dinheiro às custas de seu sofrimento e exposição.

O machismo grita nessa obra. Desde as manchetes do jornal até mesmo a atuação dos policiais. Algo nojento e cheio de julgamentos. Katharina é julgada por tudo e todos do início ao fim da obra.

Aqui vemos que, mesmo em uma democracia consolidada, é possível que um indivíduo perca todos os seus direitos fundamentais. Indico fortemente esse livro e tem vídeo vindo por aqui!

Book Review: “Despertar os Leões” de Ayelet Gundar-Goshen

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“Apesar de a ciência gostar muito de leis genéricas, constantes, as pessoas, assim como se constata, gostam de ser diferentes umas das outras”

GOSHEN-GUNDAR, Ayelet. Despertar os Leões – Tradução de Paulo Geiger. Editora Todavia, 1ª ed., 2020. Loc 76

“Despertar os Leões” de Ayelet Gundar-Goshen foi definitivamente um dos melhores livros que li nesse ano. A obra permitiu com que eu conhecesse um pouco da cultura israelense, dificuldades em ser refugiado e também sobre fluxos de consciência (na medida em que a própria escritora é psicóloga).

A experiência da Ayelet com a psicologia foi essencial para toda a obra. O livro nos faz entrar no psicológico de três personagens: Eitan, Liat e Sirkit. O protagonista é o Eitan, um homem branco, rico e neurocirurgião, que é casado com uma investigadora chamada Liat.

A vida dos dois é super comum e privilegiada: moram em um bairro bom, casa própria, carros e dois filhos. Mal sabia Eitan que a sua vida mudaria após um fatal crime: ele acaba atropelando um refugiado da Eritreia 🇪🇷 (um minúsculo país no continente africano) e entra em uma dívida com Sirkit (esposa da vítima).

A Sirkit é super criminosa e “prende” Eitan em sua dívida por meio de dois sentimentos humanos: culpa e desejo. Mas não muito da maneira que vocês podem estar pensando… esse livro vai te surpreender!

O livro permite com que a gente se aprofunde na consciência de todos os personagens e entramos nas neuras deles (e eles criam novas na gente também haha). Eitan é um homem bastante escroto e foi super interessante entrar na mente dele, em especial. Nesse mesmo cenário, vemos as dificuldades de Sirkit e as inseguranças de Liat.

É um livro que me deixou ansiosa e tive vontade de engolir o mais rápido possível para saber o desfecho. Ele terminou com o resultado que eu queria (aleluia, irmãos), mas não da maneira que eu pensei.

Indico fortemente essa leitura para todo mundo interessado em livro que te prende do começo ao fim e que instiga a ter questionamentos novos.

Book Review: “Era uma vez uma mulher que tentou matar o bebê da vizinha” de Liudmila Petruchévskaia

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“A morte anda por onde não há juiz – e a morte se instalou na cidade. Gente espancada morria, na rua ou na famosa floresta do Paraíso, e não havia julgamentos ou investigações. Todos tinham medo de buscar a verdade, ninguém se queixava por roubo ou furto. porque as próprias pessoas que haviam apresentado a queixa eram presas e levadas para fora da cidade”.

PETRUCHÉVSKAIA, Liudmilla. Era uma vez uma mulher que tentou matar o bebê da vizinha – Tradução de Cecília Rosas. Companhia das Letras. São Paulo, 2013. Página 144.

Pensa em contos russos, curtos e de terror super bons. Se você parou para pensar, com certeza deve ter lembrado da Liudmila Petruchévskaia! Que livro interessante.

Vale recordar que Liudmila foi muito censurada pelo regime da União Soviética, além de ser, atualmente, uma das escritoras contemporâneas mais proeminentes da Rússia e uma das escritores mais aclamadas de todo o leste europeu, sendo considerada uma das melhores escritores russas vivas (comparada à Poe e Gógol).

Como ela era muito censurada, você não vai encontrar palavras como “comunismo” na obra, mas sim uma descrição completa da situação de pobreza e solidão que as pessoas viviam durante o período soviético. Eu senti que a questão do machismo e angústias femininas aparecem bastante em alguns contos.

O livro é um conjunto de contos curtos de terror e com uma forte pegada política. Ele é dividido em 4 partes: Canções dos eslavos do leste, alegorias, réquiens e contos de fadas. Você consegue notar que a escritora tenta recuperar muitos elementos do folclore/contos de fada russo e trata de questões sinistras que muita gente pode se identificar (como aquela sensação de Poltergeist dentro de casa quando se está sozinho…).

São contos realmente assustadores e com finais bastante surpreendentes. Aquela sensação de ler os grandes clássicos russos permanece por conta da escrita de Liudmilla, só que se torna bastante especial ao tratar de temas do nosso mundo atual.

Os meus contos prediletos foram: “A vingança”, “Higiene”, “Tem alguém em casa”, “A menina nariz” e “O segredo de Marilena”. Esses contos falam da relação de duas vizinhas (na qual uma delas quer matar o bebê da outra), de magia envolvendo um nariz horrível em uma mulher e uma maldição que juntou duas bailarinas em uma só pessoa.

Eu indico para todo mundo que quer conhecer uma escritora russa super boa e que curte sentir um medo na leitura.

Book Review: “Hibisco Roxo” de Chimamanda Ngozi Adichie

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Essa foi a escolha para o mês de julho/2020 do leitura no Clube de Leitura @LivrosdeLei e foi um sucesso! A história é emocionante e nos conta um pouco da vida de Kambili, uma menina nigeriana que vive em um mundo com fanatismo religioso, autoridade parental e o colonialismo. Caso queira comprar o livro: Hibisco roxo

Esse foi o meu primeiro contato com os livros da Chimamanda Ngozi Adichie e eu fiquei bastante impressionada com o quanto a leitura de um tema tão pesado se torna leve. O livro é super fluido e é possível acabar a leitura em poucos dias.

A Kambili é uma garota adolescente que vive com o seu pai (Papa), mãe (Mama) e irmão (Jaja). A família de Kambili é bastante rica e seu pai é um famoso líder local e dono de um jornal. A garota sofre bastante com o autoritarismo e o fanatismo religioso de seu pai, que acaba agredindo fisicamente tanto ela quanto o seu irmão e a sua mãe.

A história muda quando Kambili e Jaja vão passar uns dias na casa da tia Ifeoma, irmã do Papa. Ifeoma mora em uma cidade universitária e em uma situação de pobreza diferente da vida de luxo que Kambili e Jaja vivem com seus pais. Logo, Kambili aprende outras formas de viver e convive com seus primos e o seu avô Papa-Nnukwu.

Durante esse período na casa da tia Ifeoma, Kambili mantém mais contato com o seu avô (que é visto como um “pagão” por seu pai) e com outros personagens, como o Padre Amadi – o padre de uma Igreja próxima a casa de Ifeoma. O Padre Amadi se preocupa com Kambili e a ajuda a “se soltar”, pois a menina tinha um comportamento estranho devido aos traumas que Papa introduziu em sua criação.

Eu espero ter feito você ficar com vontade de ler até aqui! Porque não quero me estender e acabar contando o fim da história, que é brilhante. O fim é totalmente inesperado e nos mostra uma nova faceta dos personagens. Ou melhor, “os humilhados sendo exaltados”. Indico esse livro para todo mundo!

Book Review: “Flush” de Virgínia Woolf

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“Yet it was in the world of smell that Flush mostly lived. Love was chiefly smell; form and colour were smell; music and architecture, law, politics and science were smell. To him religion itself was smell. To describe his simplest experience with the daily chop or biscuit is beyond our power”

Flush – Virginia Woolf
Esse livro estava na minha lista de leituras há muito tempo, mas um post da @apseudocrítica me incentivou a finalmente começar a ler. Eu o achei bastante diferente, mas que ainda foi possível sentir o toque suave e complexo da escrita de Woolf.

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A obra foi baseada nos estudos que Woolf fez sobre a trajetória de Elizabeth Barrett Browning (1806-1861), uma poeta inglesa do período vitoriano. Woolf acreditava que Browning deveria ter tido um impacto maior na vida dos leitores do que de fato teve. Não obstante, a vida de Browning, aparentemente, “ofuscou” suas obras, pois ela era uma mulher “polêmica para a sua época”, por ser abolicionista e auxiliar nas alterações das leis trabalhistas para crianças.

De todo modo, no começo da década de 1930, a vida de Browning (e, consequentemente, de seu cachorro Flush) estavam na mente de Virginia Woolf. A partir deste ponto, Woolf cria uma história em uma perspectiva bastante diferente: ela conta parte da história da vida de Browning (como escritora) sob o olhar de seu cachorro Flush.

Em várias partes do livro podemos notar as dificuldades que Browning tinha para escrever, assim como Woolf já havia retratado na obra “Um Teto Todo Seu”, mas o livro abarca questões bem mais complexas e contemporâneas da sua época de escrita.

O livro mostra de maneira muito clara o contexto sociopolítico do começo do século XIX, em especial na ascensão do fascismo e nazismo na Europa e a enorme desigualdade social entre ricos e pobres. De acordo com Anna Snaith, “em Flush, Woolf explora a política de rebaixamento e hierarquia ligando sistemas de valor ao longo das linhas literárias (ortodoxa e genérica), de classe, de gênero, de espécies e de raça”.

A leitura do livro é bastante leve e divertida. Flush é um personagem que analisa todos os acontecimentos, mas que não foge do nível de complexidade/individualidade que envolve os pensamentos do cão, muitas vezes mostrando um comportamento “descompensado” para os humanos, mas natural e instintivo para os animais.

Muitas vezes acabei interpretando o Flush como um senhor inglês bastante tradicional, mas acredito que este traço da personalidade dele é parte da crítica social de Woolf. Achei interessante como ela tenta nos mostrar uma desigualdade até em relação aos cães: “But the dogs of London, Flush soon discovered, are stricly divided into different classes. Some are chained dogs; some run wild. Some take their airings in carriages and drink from purple jars; others are unkempt and uncollared and pick up a living in the gutter”. Outro ponto interessante (e que realmente entendemos a crítica social) ocorre quando Flush é roubado, pois há uma descrição muito clara do bairro pobre e os contrastes com o que Flush estava acostumado.

Ainda, o livro nos mostra a viagem que Browning faz com Flush para a Itália (onde a questão do fascismo fica mais forte ainda) e o envelhecimento dos dois. E, por fim, acompanhamos o nascimento do bebê de Browning e o livro termina na morte tranquila de Flush.